Diversos estudos estão sendo conduzidos em todo o mundo no sentido de entender e mapear as consequências do isolamento social para a saúde física e mental da população, entre elas a obesidade, cada vez mais prevalente em adultos, adolescentes e crianças.
“Há um estudo que usou até mesmo o termo Covibesity (em tradução livre, “Coviobesidade”), para se referir a essa condição”, comenta Dra. Camila Mascaretti Dias, pediatra e endocrinologista infantil da Rede de Hospitais São Camilo de São Paulo, que alega que as crianças estão sendo fortemente afetadas na pandemia.
Segundo os registros do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), uma em cada três crianças com idade entre cinco e nove anos está acima do peso, tendência que pode aumentar como reflexo do período atual.
A especialista ressalta que os principais fatores agravantes desse quadro, potencializados pelo longo período de isolamento social, foram incorporados ao dia a dia das famílias brasileiras, o que dificulta o resgate de uma rotina mais saudável, essencial para evitar a obesidade.
“As crianças sofrem bastante, pois o convívio escolar foi interrompido, a interação com os amigos e demais familiares se restringiu à videochamadas, as brincadeiras se limitaram ao espaço interno de casa, o que acabou por gerar aumento do estresse, frustração, ansiedade e depressão nas crianças, muitas vezes levando-as a comerem mais. É uma bola de neve”, explica.
Para a Dra. Camila, tudo isso associado ao comprometimento financeiro e emocional de muitas famílias, contribui para o aumento do consumo de alimentos ultraprocessados.
“Esse tipo de alimento, que favorece o ganho de peso, prejudicando a qualidade da alimentação, passou a ser a opção mais barata e prática em muitos lares, atendendo às necessidades daquelas famílias que não conseguiram adaptar sua rotina para cozinhar em casa”, destaca.
Qual o risco da obesidade?
A médica explica que o excesso de gordura corporal leva a uma inflamação crônica no corpo, gerando alterações metabólicas importantes que colocam o organismo em risco de desenvolver inúmeras doenças. “Resistência à insulina, dislipidemia, hipertensão e altos níveis de citocinas pró-inflamatórias são fatores que comprometem o funcionamento dos órgãos e sistemas no indivíduo obeso”, cita.
“Além disso, o consumo de alimentos que são pobres em fibras, vitaminas e fitonutrientes, e ricos em sódio, gorduras saturadas e gorduras trans, também leva a alterações na microbiota intestinal, o que compromete a imunidade como um todo”, afirma.
Como ajudar
Diante desse cenário, o mais importante é controlar o ambiente em que a criança está inserida. “Não é uma tarefa fácil, mas a mudança no quadro é fundamental para evitar problemas graves decorrentes do excesso de peso, algo com o qual as crianças podem ter que lidar pelo resto da vida”, alerta a médica.
Uma medida simples é evitar a exposição de doces e alimentos ultraprocessados. “Em uma crise de ansiedade, é muito difícil comer 10 bananas ou 15 laranjas, por exemplo, mas um pacote de bolacha ou uma caixa de bombons inteira podem ser alvos fáceis”.
Isso ocorre, segundo a especialista do São Camilo, porque os alimentos naturais e integrais contém muitas fibras e água, sendo praticamente impossível extrapolar um excesso grande de calorias, mesmo consumindo quantidades maiores desses alimentos. “E mesmo ultrapassando a quantidade, a saciedade vai ser muito mais duradoura, pois a digestão será mais lenta, o que levará a pessoa a comer menos nas horas subsequentes”, frisa.
A principal recomendação aos pais, portanto, é focar nas refeições principais, enriquecendo-as com legumes, vegetais, grãos integrais e leguminosas. Para os lanchinhos, deve-se deixar à disposição frutas secas ou in natura, castanhas, pipoca e outros alimentos não processados ou pouco processados.
Combate ao sedentarismo
Não é segredo para ninguém que a atividade física é fundamental para benefício da saúde geral. No entanto, o isolamento social teve grande impacto no aumento do sedentarismo tanto na população adulta quanto nas crianças e adolescentes.
A endocrinologista infantil ressalta que reduzir o tempo de exposição a telas e estimular pelo menos uma hora de atividade física diária entre os pequenos é uma questão essencial.
Essa atividade pode vir por meio de brincadeiras de desafio ou dança, por exemplo. Os pais podem desafiar a criança a realizar um movimento com o corpo, imitar animais ou estimular jogos de mímica, enfim atividades divertidas que podem ser incorporadas em um momento do dia.
Os pais devem estar atentos, ainda, a qualquer sinal de distúrbio relacionado à ansiedade ou depressão:
– Alterações no sono
– Choro fácil
– Alterações bruscas de humor
– Desânimo ou desinteresse por atividades que antes eram prazerosas
– Dificuldades escolares
A recomendação da Dra. Camila, nesses casos, é buscar o atendimento do pediatra, que poderá orientar o acompanhamento psiquiátrico ou psicológico da criança, se necessário.