Alheio à lenta retomada da economia, o mercado para investimentos em startups segue em expansão.
O setor partiu de um total investido pelos fundos de venture capital (capital de risco) de R$ 1,2 bilhão em 2015 e deve chegar a R$ 6,8 bilhões neste ano, segundo dados da ABVCAP (associação que reúne fundos do tipo). A base de comparação pequena ajuda na alta acelerada do setor.
Pedro Sirotsky Melzer, sócio da gestora e.Bricks, diz ver esse avanço como resultado da maturação do mercado, de um lado, e da queda de juros básicos da economia, por outro. A taxa Selic era 14,25% ao ano em 2015 e agora está em 6%, com perspectiva de novas reduções e de que esse patamar historicamente baixo permaneça por algum tempo.
Segundo o executivo, quando ele iniciou neste mercado, no início da década, não era claro se profissionais talentosos iriam se interessar por abrir startups. Agora, após casos de sucesso como 99, Nubank e Gympass, o mercado já se mostra atraente para executivos bem qualificados, diz.
Daniel Chalfon, sócio da gestora Astella, diz que a queda dos juros faz com que grandes investidores sejam levados a procurar investimentos alternativos, de longo prazo e com menos possibilidade de resgate antecipado. Essas condições tendem a ampliar o potencial de retorno.
O patamar dos investimentos no Brasil também mudou, principalmente em 2019, com a chegada do grupo japonês Softbank ao mercado.
Em poucos meses, a companhia fez grandes aportes nas empresas Loggi (US$ 150 milhões ou R$ 621 milhões) e Gympass (US$ 300 milhões ou R$ 1,2 bilhão). Já o Nubank recebeu US$ 400 milhões (R$ 1,7 bilhão) do fundo americano TCV, primeiro deles no Brasil.
“Antes, quando um empresário recebia uma proposta de R$ 100 milhões, ele vendia sua empresa. Agora, há a possibilidade de permanecer no negócio por mais tempo e buscar um crescimento maior”, diz Chalfon, que está no mercado desde 2008.
Humberto Matsuda, conselheiro da ABVCAP, diz que os fundos estrangeiros vêm se interessando pelo Brasil porque, nos últimos anos, foi construída uma estrutura de investimentos para iniciar negócios no país. Isso permitiu que startups brasileiras alcançassem um tamanho atrativo para investidores internacionais.
Pequenos investidores, porém, também são atraídos pela possibilidade de aplicar dinheiro em empresas novatas. Para eles, o caminho são plataformas que permitem aportes a partir de R$ 100.
Reguladas pela CVM desde 2017, existem 24 plataformas que oferecem o serviço, que inclui seleção das startups, disponibilização de suas propostas e apoio no relacionamento após o investimento.
O valor captado por meio desses serviços foi de R$ 12,8 milhões em 2017 para R$ 46 milhões no ano passado.
Assim como grandes investidores penam para conseguir fazer o dinheiro render, o pequeno poupador também busca alternativas em cenário de juros baixos.
A ideia das plataformas é permitir o acesso de pessoas comuns a aplicações em startups, mesmo que elas tenham valores baixos para investimento nesse mercado. Na Organismo Brasil, por exemplo, é possível aplicar R$ 100.
Wesley Café Calazans, 22, formado em arquitetura, investiu em quatro startups a partir da plataforma Kria, usando parte do dinheiro que ganhou como estagiário.
Em cada aplicação foram R$ 500, que também é o valor mínimo exigido na plataforma. Entre seus investimentos estão uma fintech (empresa que usa tecnologia para inovar no setor financeiro), na própria Kria e um bar especializado em cervejas artesanais.
Ele diz que se interessou por investimentos em novas empresas por ter visto que muitas startups têm crescido e se valorizado, o que permitiria um bom retorno para quem colocou dinheiro nelas no início.
“Como dá para investir com pouco, sem se arriscar tanto, acho legal. Coloco sempre o valor mínimo, para diversificar, pois sei que elas correm o risco de falir”, diz.
Brian Begnoche, sócio da plataforma de investimentos EqSeed, diz que a maior parte dos investidores são empresários que já tiveram sucesso em outras empresas, profissionais do mercado financeiro e executivos que usam o investimento em startups para conhecer sobre inovação em seus setores de atuação.
Segundo especialistas, startups são investimento de risco e devem ocupar apenas uma pequena fração do portfólio de investimentos.
Isso porque há o risco de que o investidor perca o que aplicou, caso a empresa não dê certo. Há também a dificuldade de repassar a participação na empresa a outro investidor, caso precise do dinheiro.
Em geral, ganha-se nesse mercado quando um fundo de investimento ou uma empresa grande compra ações da startup, o que costuma levar anos.