Após 20 anos, assassinato de prefeito de Campinas prescreve e fica sem solução

Toninho foi assassinado na noite do dia 10 de setembro de 2001, logo depois de ter saído de um shopping, onde foi buscar um terno que havia comprado.


Por Folhapress
Após 20 anos, assassinato de prefeito de Campinas prescreve e fica sem solução

Antonio da Costa Santos, o Toninho, do PT - Foto de Moacyr Lopes Junior/Folhapress

Ocorrido há exatos 20 anos, o assassinato do prefeito de Campinas Antônio da Costa Santos, o Toninho do PT, passa a ser considerado prescrito pela Justiça a partir desta sexta-feira (10). Por isso, a família deverá protocolar uma denúncia de omissão contra o Estado brasileiro junto à comissão interamericana de direitos humanos, órgão ligado à OEA (Organização dos Estados Americanos).


Toninho foi assassinado na noite do dia 10 de setembro de 2001, logo depois de ter saído de um shopping, onde foi buscar um terno que havia comprado.


Por volta das 22h, quando voltava para casa dirigindo seu Fiat Palio, recebeu três tiros que partiram de um veículo onde, segundo a polícia, estavam quatro criminosos que pouco antes haviam praticado um sequestro-relâmpago.
Um dos tiros atingiu a veia aorta e Toninho morreu na hora. Naquele dia, completava oito meses e dez dias no cargo na maior cidade do interior paulista.


A prescrição é o reconhecimento de que não houve condenação ou execução penal de alguém por um crime e que a partir de agora não poderá mais fazê-lo. Assim, a emblemática morte do prefeito vai entrar para a história como tendo sido praticado por um “autor desconhecido”.


“Nós aguardamos essa data, então, para enviar à OEA, mais precisamente à comissão interamericana de direitos humanos, uma denúncia em que estamos relatando que a República Federativa do Brasil descumpriu a convenção americana de direitos humanos. Nós entendemos que houve neste caso uma falha gritante de todos os agentes públicos e em todas as instâncias”, disse o advogado da família, William Ceschi Filho, que trabalha no caso há dez anos.


Viúva de Toninho, a psicanalista Roseana Garcia disse nesta sexta que está revoltada com a situação. “O Antônio não merecia isso. Imagina esperar 20 anos para dar isso”, afirmou.


Ela disse porque decidiu recorrer a instâncias internacionais. “Se eu não posso mais ser ouvida no Brasil, vou para fora. Minha indignação não pode parar.”


“Me lembro que uma vez um promotor chegou a dizer pra mim: ‘o que conseguiria fazer em oito meses?’. Isso mostra o total desconhecimento da Justiça sobre o meu marido, um homem que enfrentou a especulação imobiliária, que tinha ações populares contra grandes empreiteiras, que contrariava grandes interesses”, afirmou.


A família de Toninho decidiu recorrer à corte internacional por acreditar que o prefeito foi vítima de crime político, contrariando frontalmente a tese da Polícia Civil e do Ministério Público Estadual, segundo os quais o assassinato foi uma fatalidade, resultado da violência urbana.


O traficante e sequestrador Wanderson Nilton de Paula Lima, o Andinho, chegou a ser acusado formalmente pelo crime. Para a polícia, Andinho e os companheiros ocupavam o carro de onde partiram os disparos contra o então prefeito.


Os três companheiros de Andinho, no entanto, acabaram mortos em operações policiais em 2003, em Caraguatatuba, no litoral norte de São Paulo.


Único sobrevivente, Andinho acabou sendo apontado como o responsável pelo crime. Ele sempre negou a autoria.
Essa denúncia, no entanto, foi rejeitada pela Justiça em 1ª e em 2ª instâncias por falta de consistência. Na última, por unanimidade.


“O inquérito não levou em conta a história da vítima”, diz o advogado. “Tivemos um inquérito com apenas uma tese de crime banal, que desconsiderou uma vida de luta em defesa de justiça social, de direitos sociais, de direito à moradia”, disse Ceschi.


De acordo com ele, não levou em conta a trajetória de Toninho, “que estava com a caneta na mão, contrariando grandes interesses”.


O defensor avalia que o inquérito foi marcado por graves erros de condução.


“Na primeira fase, tivemos agentes públicos envolvidos com a CPI do Narcotráfico, que passaram a atuar na investigação”, disse.


Em 2011 o inquérito foi reaberto e novos problemas vieram à tona, conforme ele, como a falta de estrutura policial para a investigação.


“O Ministério Público de São Paulo, por sua vez, não requisitou diligências nessa nova fase. Ignorou, a nosso ver, a denúncia de falta de estrutura da polícia. Pedimos ao Ministério da Justiça a instauração de um inquérito pela Polícia Federal para que pudesse, de forma concorrente, atuar na investigação estadual. Esse pedido foi indeferido”, disse.
O advogado recorreu então à Procuradoria-Geral da República, pedindo que fosse deslocada a competência da Justiça Estadual para a Justiça Federal -e da Polícia Civil para a Polícia Federal.


A PGR pediu informações à Procuradoria-Geral de Justiça de São Paulo e a informação prestada pelo chefe do Ministério Público Estadual foi a de que as diligências estavam em curso e que uma força-tarefa havia sido criada pelo diretor do Deinter (Departamento de Polícia Judiciária do Interior) de Campinas.


“A força-tarefa, na verdade, era uma equipe composta por um delegado, dois carcereiros e um escrivão, que durou menos de seis meses e ouviu apenas seis pessoas”, disse.


Neste ano, em 8 de julho, a Promotoria pediu o arquivamento do inquérito policial alegando que não havia mais diligências a fazer.


Sobre as críticas, por meio de nota o promotor Ricardo Silvares disse que os advogados da família não expressaram esse ponto de vista nas investigações. “Ao contrário, concordaram com o resultado dos trabalhos conduzidos pela Polícia Civil”, disse.


Segundo ele, a Promotoria “sempre buscou apurar a existência de mandantes e, para constatar isso, basta ler o processo”. “O que, infelizmente, não tem sido o costume daqueles que apresentam palpites sobre o caso.”
Para o promotor, a afirmação de que o Ministério Público não se interessou em apurar crime político “é simplesmente falsa”.


A reportagem procurou nesta sexta a Secretaria da Segurança Pública sobre as críticas do advogado, mas não houve resposta.


Roseana Garcia disse que não participaria de nenhuma agenda pública de homenagens a Toninho nesta sexta.
As duas décadas da morte foram lembradas. De manhã, um grupo de cerca de dez pessoas fez uma celebração no local onde o prefeito foi morto, na avenida Mackenzie. No local, há um monumento em homenagem a Toninho. Houve orações e o plantio de mudas de flores.


Uma celebração religiosa chamada de “Missa: 20 Anos sem Toninho!” foi marcada para o domingo (12), às 19h, na Igreja Nossa Senhora Aparecida.

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